A evasão na Educação Superior no Brasil: uma análise da produção de conhecimento nos periódicos Qualis entre 2000-2011.
Marília Costa Morosini
Alam de Oliveira Casartelli
Ana Cristina Benso da Silva
Bettina Steren dos Santos
Rafael Eduardo Schmitt
Rosana Maria Gessinger.
Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul - PUCRS
Faculdade de Educação - FACED
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Resumo. O presente artigo apresenta uma revisão sobre a evasão na Educação Superior no contexto brasileiro. Analisa a produção acadêmica sobre o tema nos principais periódicos da área de Educação no país. A busca realizada privilegiou as revistas de classificação A e B, segundo os critérios de qualidade postuladas pelo sistema Qualis da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), no período compreendido entre 2000 e 2011. A análise sobre o material encontrado procedeu-se a partir de três categorias, definidas a priori: 1) conceitos de evasão; 2) Resultados das investigações analisadas; e 3) Causas e consequências da evasão. Sob essas categorias, buscou-se descrever os principais aspectos apresentados em cada um dos trabalhos, possibilitando uma análise abrangente sobre a produção recente relacionada à evasão acadêmica no Brasil. A análise realizada oportunizou a identificação de tendências e fragilidades na referida produção, além de proporcionar reflexões para futuros estudos sobre o tema.
Palavras Chave: Evasão, Educação Superior, Produção de conhecimento, Revisão bibliográfica, Periódicos Qualis - CAPES.
1. Introdução
A evasão estudantil pode ser definida como um fenômeno educacional complexo, que ocorre em todos os tipos de instituição de ensino e afeta o sistema educacional como um todo. Entendida como a perda de alunos nos diversos níveis de ensino, a evasão gera conseqüências sociais, acadêmicas e econômicas, afetando o desenvolvimento humano de todas as nações. Diante de sua importância, o tema tem sido objeto de investigações em todo o mundo, as quais buscam aprofundar os motivos, as causas e os impactos provenientes do abandono dos estudantes nos sistemas de ensino.
No Brasil, a maioria dos estudos ligados à evasão está voltada para a Educação Básica, sendo ainda escassos os trabalhos realizados sobre a temática na Educação Superior. No entanto, uma busca sistemática nos principais indexadores da produção acadêmica demonstra um crescimento na produção de investigações e artigos científicos relacionados à evasão na Educação Superior, sobretudo, na última década.
Nesse contexto, o presente artigo apresenta uma revisão sobre o tema da evasão na Educação Superior no Brasil, analisando a produção recente nos principais periódicos da área de Educação no país. A pesquisa realizada privilegiou as revistas de estrato A1, A2, B1 e B2, segundo as normas de classificação postuladas pelo sistema Qualis da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES).
As buscas foram realizadas a partir do Portal de Periódicos da CAPES, bem como, através do sistema Scientific Electronic Library Online (SCIELO). Em ambos os sistemas,foram rastreados mais de 200 (duzentos) periódicos, definindo a busca a partir dos termos “evasão”, “educação superior” e seus correlatos, tais como “abandono”, “permanência”, “fracasso” e “ensino superior”. Além do contexto geográfico e da delimitação dos periódicos pesquisados, estabeleceu-se a última década como período temporal, de forma que foram selecionadas somente produções publicadas no período entre 2000 e 2011.
1 Qualis é um conjunto de procedimentos utilizados no Brasil pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) para estratificação da qualidade da produção intelectual dos programas de Pós-Graduação. A partir desse sistema os principais periódicos são classificados segundo estratos indicativos da qualidade. Os indicadores variam de A1 – o nível mais elevado, até C– o nível mais baixo da qualidade da produção. Fonte: http://www.capes.gov.br
O resultado inicial da pesquisa revelou a existência de aproximadamente 70 (setenta) trabalhos, segundo os critérios estabelecidos. Entretanto, uma análise de conteúdo sobre o material encontrado identificou que somente 7 (sete) trabalhos atendiam à especificidade do tema, no contexto da Educação Superior. Esses sete trabalhos constituíram o corpus do presente artigo.
O processo de análise do material selecionado foi realizado com base em três categorias, construídas a partir do conteúdo encontrado nas produções. As categorias, definidas a priori foram: 1) Conceitos de evasão; 2) Resultados das investigações analisadas; e 3) Causas e consequências da evasão.
Sob essas categorias, buscou-se descrever os principais aspectos apresentados em cada um dos trabalhos, possibilitando uma análise abrangente do fenômeno da evasão acadêmica no Brasil. Além do material selecionado, procurou-se enriquecer o referencial com algumas Teses e Dissertações realizadas sobre o tema, considerando, igualmente, a última década.
Por fim, apresenta-se uma síntese das principais conclusões possibilitadas a partir dos trabalhos encontrados sobre evasão na Educação Superior brasileira. Identificam-se tendências e fragilidades na referida produção, além de apresentar reflexões para futuros estudos sobre o tema.
2. Conceitos de evasão
Inúmeros conceitos de evasão foram encontrados nas produções analisadas. Em contextos mais abrangentes destaca-se o definido por Gaioso (2005), como sendo a interrupção no ciclo de estudos, em qualquer nível de ensino. Especificamente na Educação Superior o termo evasão é frequentemente utilizado para referir a “perda” ou “fuga” de alunos da universidade (KIRA, 2002). Baggi e Lopes (2011) também definem a evasão como a saída do aluno da instituição antes da conclusão de seu curso.
Polydoro (2000) chama a atenção para a distinção entre dois conceitos: a evasão do curso – que consiste no abandono do curso sem a sua conclusão – e a evasão do sistema – que reflete o abandono do aluno do sistema universitário. Cardoso (2008) refere-se aos conceitos acima a partir de diferentes nomenclaturas: a evasão aparente – enquanto a mobilidade do aluno de um curso para o outro – e a evasão real – que se refere à desistência do aluno em cursar o ensino superior.
Silva Filho e colaboradores (2007) definem dois aspectos sob os quais a evasão pode ser analisada. A evasão anual média e a evasão total. A evasão anual média corresponde à porcentagem de alunos que, não tendo se formado, não realizaram matrícula no ano seguinte. Esse índice demonstra as perdas médias anuais em determinado curso, instituição ou conjunto de instituições. A evasão total corresponde à quantidade de alunos que, tendo entrando em determinado curso, IES ou sistema de ensino, não obtiveram diploma, considerando um determinado período.
Ainda sobre os conceitos e possibilidades de análise, Silva Filho e colaboradores (2007) também pontuam que há diferentes mecanismos de análise da evasão, a qual pode ser mensurada por instituição, conjunto de todas as instituições de um país, em determinado curso, em determinada região geográfica, por categoria administrativa (público / privado), por forma de organização acadêmica (universidades, centros universitários, faculdades, institutos superiores) e por áreas de conhecimento, entre os principais estudos possíveis de serem realizados.
3. Resultados das investigações analisadas
A partir da análise no material encontrado sobre evasão nos principais periódicos brasileiros, possibilitou-se identificar algumas características. Dentre os sete trabalhos analisados, verificou-se um predomínio de investigações de natureza qualitativa, sendo esta a orientação metodológica em cinco dos trabalhos analisados, enquanto que somente dois trabalhos basearam-se nos métodos quantitativos de pesquisa.
Quanto aos métodos e técnicas empregadas nas investigações, verificou-se que dentre os trabalhos qualitativos, dois estudos utilizaram entrevistas em profundidade a partir de roteiro semi-estruturado, outros dois trabalhos realizaram análise documental e, um realizou uma análise bibliográfica sobre o tema da evasão. Nas pesquisas quantitativas, o principal método utilizado consistiu na estatística descritiva e, também, na proposição de modelo causal explicativo, a partir de técnicas de regressão e correlações.
Ao verificar a abrangência das pesquisas analisadas, constatou-se que a maioria realizou investigações sobre contextos específicos e locais, investigando aspectos relacionados à evasão em um determinado curso de graduação. Destaca-se que nos cinco trabalhos que realizaram estudos em um único curso de graduação, todos foram realizados em instituições públicas federais.
Apenas dois, dentre os trabalhos analisados, voltaram-se para contextos abrangentes, sendo um deles realizado a partir de dados de uma instituição pública, enquanto que o outro apresentou um estudo macroscópico da evasão no contexto brasileiro, a partir de dados oficiais divulgados nos Censos da Educação Brasileira.
Considerando os diferentes recursos metodológicos utilizados, procurou-se nessa categoria de análise, descrever os principais resultados encontrados nas investigações analisadas. Dessa forma, passa-se a descrever brevemente cada um dos estudos, destacando os principais elementos norteadores, bem como seus resultados.
No primeiro trabalho analisado, Silva Filho et al. (2007) realizaram um consistente estudo da evasão no ensino superior brasileiro, a partir de dados oficiais do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP). Com base no período 2000 – 2005, se constatou que para o conjunto de todas as Instituições de Ensino Superior (IES) no Brasil a evasão anual média se manteve próxima de 22%, no período analisado.
A pesquisa demonstrou que esses dados variam significativamente segundo a categoria administrativa. Enquanto que nas instituições públicas a evasão anual média se situou em aproximadamente 12%, nas privadas o índice oscilou de 22 a 28% no período analisado (2000-2005), registrando-se a média de 26%.
A análise também foi realizada segundo a forma de organização acadêmica. Os autores evidenciaram que as Universidades detêm os menores índices de evasão, os quais oscilaram entre 16 e 22%, estando a média estabelecida em 19%. A mesma média geral foi verificada para os Centros Universitários, mesmo que a variação no período tenha se diferenciado entre 9 e 25%. Os maiores índices de evasão segundo a organização acadêmica foram verificados para as Faculdades, nas quais percebeu-se uma variação entre 28 e 33%, registrando-se a média de 29%.
Nesse mesmo estudo, os autores buscaram correlacionar os índices de evasão com a relação candidato por vaga em alguns cursos. Como conclusão verificou-se uma correlação negativa entre os índices de evasão e a demanda por curso, isto é, quanto maior a densidade candidato/vaga nos concursos vestibulares, menores são os índices de evasão verificados.
Em outro estudo, Baggi e Lopes (2011) conduziram uma recente revisão bibliográfica sobre evasão e avaliação institucional no ensino superior brasileiro. A pesquisa foi realizada no Banco Digital de Teses e Dissertações (BDTD) a partir dos termos “evasão”, “ensino superior”, “avaliação institucional” e termos correlatos. Dentre os 59 resultados encontrados para a evasão, apenas quatro dentre os trabalhos encontrados estavam voltados para o ensino superior. Esse fato, por si só, mostra que, embora se observe um crescimento na produção acadêmica sobre evasão no ensino superior, essa produção é, ainda, escassa.
Dentre as Teses e Dissertações analisadas pelas autoras tem-se a Tese de Polydoro (2000) que investigou o trancamento de matrícula e as condições envolvidas na saída e no retorno do estudante à instituição. A pesquisa foi realizada em uma instituição privada na cidade de Campinas/SP. O estudo apontou que os acadêmicos, de maneira geral, relacionaram o trancamento de matrícula a uma possibilidade de manutenção do vínculo com a IES, de forma a oportunizar o reingresso, encarando a situação como algo transitório. Entretanto, os resultados da análise permitiram concluir que somente 9,65% dos alunos que se enquadraram em situação de trancamento ou cancelamento realizaram rematrícula, considerando um período de cinco anos.
Também se destaca a Dissertação de Mestrado apresentada por Cardoso (2008) que analisou os efeitos das políticas de cotas na Universidade de Brasília (UnB), sob o ponto de vista do rendimento e evasão dos alunos cotistas. O plano de cotas, instituído nessa universidade em 2003, busca a integração social, étnica e racial por meio da garantia de vagas para negros e indígenas (cotistas) nas universidades públicas. Considerando o período 2004-2006, o estudo investigou o impacto do programa de cotas sob o rendimento e evasão dos alunos cotistas.
Dentre os principais resultados, a dissertação apontou que os cotistas tendem a se candidatar em maior proporção para os cursos de menor prestígio social. O desempenho médio dos cotistas não diferiu substancialmente dos não- cotistas entre os cursos de menor prestígio. Entretanto nos cursos de maior prestígio os alunos cotistas obtiveram rendimento significativamente inferior, quando comparados com os alunos não-cotistas.
Outro importante aspecto consistiu na verificação de que os cotistas evadem em proporções menores que os não-cotistas e, além disso, cotistas que trabalhavam e estavam indecisos sobre a escolha do curso, no momento da inscrição, evadiram em maior proporção que os cotistas que não trabalhavam ou estavam absolutamente decididos quanto à escolha do curso.
Em outro enfoque investigativo, Andriola e colaboradores (2006) apresentaram um importante estudo da evasão estudantil a partir da percepção de docentes e coordenadores de curso de graduação. Participaram do estudo 52 docentes e 21 coordenadores de cursos da Universidade Federal do Ceará. A pesquisa foi realizada através de entrevistas em profundidade, a partir de um questionário semi-estruturado abordando diferentes aspectos, relacionados com a gestão e infra- estrutura no contexto investigado. A análise dos dados deu-se por meio da análise de conteúdo, descrevendo-se a ocorrência dos fatos observados.
Os resultados demonstraram que os docentes investigados possuem opinião favorável ao resgate da função do professor orientador para auxiliarem os alunos na superação de suas dificuldades durante os cursos de graduação, situação que, segundo eles, influi de forma decisiva sobre o abandono/permanência do aluno no curso de graduação. Os participantes opinam sobre a necessidade das coordenações de curso ofereceram informações mais precisas e relevantes sobre os cursos, para todos os potenciais candidatos aos cursos de graduação. Os docentes e coordenadores enfatizam a necessidade de melhorias na infra-estrutura física do contexto investigado, com atenção especial às condições das salas de aula e laboratórios, como aspectos essenciais para a retenção dos alunos.
Nessa mesma investigação, Andriola e colaboradores (2006) também apresentam dados de uma investigação anteriormente realizada com 86 estudantes evadidos. Nesse estudo os autores propuseram a elaboração de um modelo causal explicativo para a intenção dos alunos evadidos em cursar outro curso superior. A partir do método de regressão linear múltipla, a intenção de voltar a cursar outro curso após evadir, relacionou-se com outras quatro variáveis independentes, de alto valor explicativo: a) grau de informação acerca do curso universitário; b) opiniões acerca das limitações do curso abandonado; c) satisfação com o abandono; e d) contribuição econômica familiar.
Os resultados da análise sobre o modelo causal demonstraram que a variável “grau de informação acerca do curso universitário” foi a que melhor explicou a intenção do aluno em retornar para outro curso de graduação. Destaca-se também que a variável “opiniões acerca das limitações do curso abandonado” também apresentou uma significativa contribuição para o modelo causal. Já as variáveis “satisfação com o abandono” e “contribuição econômica familiar”, embora tenham composto o modelo causal apresentado, demonstraram menor contribuição explicativa para a intenção do aluno em retornar para outro curso superior.
Villas Bôas (2003) apresentou um estudo realizado no curso de Ciências Sociais da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), com o objetivo de investigar as relações entre as reformas curriculares realizadas no referido curso com as taxas de evasão percebidas no mesmo, ao longo de sua história. A investigação se baseou em análise documental e dados institucionais no período entre 1939 e 1988. O estudo demonstrou que o índice médio de evasão no curso se aproximou dos 50%.
Os resultados da investigação permitiram evidenciar que as reformas curriculares ocorridas no curso de ciências sociais da UFRJ não influem sobre as taxas de evasão dos estudantes. Considerando-se o período analisado, a implementação do Programa de Iniciação Científica do Laboratório de Pesquisa Social (LPS) foi o aspecto verificado que mais contribui para a retenção dos alunos na história do curso analisado. Segundo a autora, o LPS não só manteve alto índice de alunos no curso até o término da graduação, como proporcionou uma formação acadêmica que permitiu à maioria de seus egressos a possibilidade de se dedicar a atividades profissionais voltadas para as ciências sociais. Dessa forma, a autora destaca a iniciação científica como uma ferramenta imprescindível de controle ao abandono do curso.
Outras investigações foram conduzidas em contextos locais e específicos, destacando-se dois trabalhos relacionados com o curso superior em química. Dentre eles, Cunha, Tunes e Silva (2001) buscaram analisar as razões que levaram os alunos que ingressaram no curso de química da Universidade Federal de Brasília (UFB) a saírem do curso antes da sua conclusão. A metodologia da investigação orientou-se em duas partes: a primeira consistiu em identificar a trajetória acadêmica dos alunos evadidos, enquanto que a segunda, buscou entrevistar 23 alunos selecionados aleatoriamente, dentre um universo de 320 alunos evadidos.
O período de abrangência da pesquisa compreendeu os anos entre 1990 e 1995. As entrevistas aconteceram a partir de um roteiro semi-estruturado, que contemplou três temas:
a) questões relacionadas à escolha do curso e ingresso; b) questões relacionadas às experiências durante o curso; e c) questões relacionadas à saída do curso.
Em síntese, a pesquisa possibilitou identificar que as principais razões que levaram os estudantes a abandonar se mantiveram muito relacionadas com os aspectos da vida pessoal, antes mesmo do ingresso na universidade. Dessa forma, o não atendimento das expectativas que os alunos tinham quanto ao curso antes do ingresso, se mostrou um fator muito presente.
Verificou-se entre os alunos evadidos uma elevada ocorrência de reprovação e repetência em algumas disciplinas do curso. Por fim, o estudo concluiu que o abandono na universidade é consequência dos problemas encontrados durante o curso e que, os sujeitos investigados manifestam-se muito mais em teor de protesto quanto à percepção de ineficiência do sistema universitário, do que com relação ao fracasso pessoal na universidade.
Em outra investigação relacionada à área de química, Mazzetto e Carneiro (2002) investigaram o perfil sócio-econômico, a evasão e o desempenho de alunos do curso de química da Universidade Federal do Ceará (UFC). Analisando uma amostra de 191 alunos, o estudo envolveu análise documental e coleta de dados da instituição no período entre 1995 e 2000. Os dados foram analisados quantitativamente a partir de estatísticas descritivas.
Além dos resultados específicos quanto ao perfil dos estudantes do curso de Licenciatura em Química da UFC, o estudo não possibilitou determinar qualquer relação entre o perfil sócio-econômico dos alunos com a evasão. Quanto ao desempenho dos estudantes, verificou-se que os alunos com formação secundária na rede privada de ensino e, especialmente as estudantes do sexo feminino, demonstraram desempenho superior à média geral observada. Foi possível verificar um alto índice de repetência entre os alunos evadidos, de forma que os autores sugerem uma correlação entre evasão e repetência nas disciplinas. Os resultados apontaram, ainda, que entre as causas da evasão no curso estudado, as que demonstraram maior freqüência foram a insatisfação com o curso, os conflitos quanto à escolha adequada do curso e a decepção com a universidade.
No último dentre os trabalhos analisados, Abbad, Carvalho e Zerbini (2006) buscaram identificar as variáveis explicativas da evasão em cursos à distância. Analisando uma amostra de 19.849 estudantes no ano de 2002, os autores realizaram uma análise de regressão logística, visando identificar, entre algumas variáveis da clientela do curso, quais explicavam os índices de evasão.
A partir do modelo explicativo testado, a pesquisa indicou que os alunos que concluem o curso via internet possuem características demográficas e padrões de acesso aos ambientes virtuais do curso bastante diferenciados daqueles alunos que evadem. Verificando-se uma taxa de evasão de 44,7%, os resultados mostram que os alunos não concluintes são aqueles que tendem a não utilizar os recursos de interação (chats, mural de notícias, troca de mensagens, interação como o tutor e colegas).
Como sugestão, os autores enfatizam a necessidade de incluir variáveis motivacionais como, por exemplo o valor atribuído ao curso pelo participante, para melhor integrar os modelos que buscam predizer as causas da evasão. Além de variáveis motivacionais, variáveis cognitivas, tais como estratégias, estilos e hábitos de estudo se fazem necessárias para testar possíveis interações em modelos multivariados explicativos da evasão.
4. Causas e consequências da evasão
A partir dos estudos selecionados, também se procurou elencar as principais causas para a evasão na Educação Superior. A esse respeito,Silva Filho et al. (2007, p. 643) pontuam que Baggi e Lopes (2011) mencionam as causas da evasão apontadas por Braga, Peixoto e Bogutchi (2003) os quais afirmam que a evasão é resultado da decisão do aluno ou de uma combinação de fatores sociais, econômicos e pessoais, quer seja a necessidade precoce de ingresso do aluno no mercado de trabalho, ou as dificuldades encontradas em razão das condições desfavoráveis do currículo, dos docentes e da organização da instituição.
as instituições públicas e privadas, dão como principal causa da evasão a falta de recursos financeiros para o estudante prosseguir nos estudos. É, também, o que o estudante declara quando perguntado sobre a principal razão por ter evadido. No entanto, verifica-se nos estudos existentes que essa resposta é uma simplificação, uma vez que as questões de ordem acadêmica, as expectativas do aluno em relação à sua formação e a própria integração do estudante com a instituição constituem, na maioria das vezes, os principais fatores que acabam por desestimular o estudante a priorizar o investimento de tempo ou financeiro, para a conclusão do curso. (p. 643)
Baggi e Lopes (2011) também salientam as causas apontadas por Polydoro (2000) o qual reporta os principais motivos apresentados pelos alunos no momento do trancamento da matrícula, conforme segue: suporte financeiro (50%), condições relacionadas ao trabalho (17,69%), dificuldade de integração acadêmica (16,54%) e baixo grau de compromisso com o curso (12,69%).
Cardoso (2008) aponta, além dos fatores econômicos e baixo desempenho acadêmico, a falta de identidade com o curso; escolha equivocada da profissão; desencanto com a universidade; baixa demanda pelo curso; baixo prestígio social do curso elegido.
Andriola et al. (2006, p. 366-367), com base na opnião de Tinto (1975 apud Andriola, 2006), refletem acerca da trajetória dos estudantes na universidade:
O jovem chega à universidade com intenções, objetivos e compromissos pré-definidos, que variam em função de diversas características. [...] Com o tempo, o aluno passa por uma série de interações com o ambiente acadêmico e social da instituição educacional, o que lhe permite, assim, redefinir suas intenções e seus compromissos, o que, em última instância, leva-o a persistir ou a evadir-se.
Os autores também supõem que:
A decisão de evadir-se ou de persistir no curso é um processo psicossocial, no qual as opiniões influenciam as atitudes e estas, por seu turno, influenciam as decisões. Sendo assim, a permanência ou a evasão do estudante é função das suas atitudes, da sua adaptação à universidade, e de fatores externos, como por exemplo: aprovação da família, encorajamento dos amigos, qualidade da instituição, situação financeira e oportunidade para transferir-se para outra instituição (Andriola et al., 2006, p. 367).
A pesquisa realizada por esses autores com alunos evadidos da UFC, evidenciou os seguintes motivos para o abandono na universidade (Andriola et al., 2006): incompatibilidade entre horários de trabalho e de estudo (39,4%), aspectos familiares (como por exemplo, compromisso com filhos menores) e desmotivação com os estudos (20%), precariedade das condições físicas do curso ou inadequação curricular (10%).
Cunha, Tunes e Silva (2001) destacam os aspectos relacionados à vida pessoal do estudante antes mesmo do momento do ingresso. Segundo eles, a expectativa quanto ao curso antes do ingresso consiste em um fator muito importante para a evasão/permanência do aluno na universidade. Os autores ainda salientam que a reprovação e os altos índices de repetência se relacionam diretamente com a evasão. Apesar disso, a pesquisa realizada por eles frisou que os estudantes dificilmente atribuem as causas da evasão ao seu próprio desempenho, sendo mais frequente o relato da ineficiência do curso e da universidade, segundo a opinião dos estudantes evadidos.
Cabe ainda destacar a concordância de Mazzeto e Carneiro (2002) quanto à correlação entre altos níveis de repetência e reprovação nas disciplinas com a ocorrência da evasão. Esses autores também apresentam posição consensual com os demais trabalhos ao mencionarem a insatisfação com o curso, os conflitos quanto à escolha adequada do curso e a decepção com a universidade, enquanto aspectos diretamente relacionados com a evasão.
A partir do conteúdo encontrado nos sete trabalhos, foi possível propor uma síntese dos fatores associadas à evasão, segundo a ocorrência nas produções analisadas. Dessa forma, as principais causas da evasão encontradas foram:
Aspectos financeiros relacionados à vida pessoal ou familiar do estudante;
Aspectos relacionados à escolha do curso, expectativas pregressas ao ingresso, nível de satisfação com o curso e com a universidade;
Aspectos interpessoais – dificuldades de relacionamento com colegas e docentes;
Aspectos relacionados com o desempenho nas disciplinas e tarefas acadêmicas – índices de aprovação, reprovação e repetência;
Aspectos sociais, como o baixo prestígio social do curso, da profissão e da universidade elegida;
Incompatibilidade entre os horários de estudos com as demais atividades, como, por exemplo, o trabalho;
Aspectos familiares como, por exemplo, responsabilidades com filhos e dependentes, apoio familiar quanto aos estudos, etc.;
Baixo nível de motivação e compromisso com o curso; Além de apontar as principais causas da evasão, segundo os trabalhos analisados nesse artigo, essa categoria de análise também buscou evidenciar o quanto essas produções discutem as consequências produzidas pela evasão na Educação Superior.
De um modo geral, percebeu-se que embora a maioria dos trabalhos mencione que a evasão ocasiona uma série de consequências e impactos, nenhum dentre os trabalhos analisados se deteve especificamente em aprofundar essas relações. Dentre os trabalhos analisados, o maior esclarecimento quanto às conseqüências do fenômeno da evasão foram apresentados por Silva Filho e colaboradores (2007, p. 642), conforme segue:
As perdas de estudantes que iniciam mas não terminam seus cursos são desperdícios sociais, acadêmicos e econômicos. No setor público, são recursos públicos investidos sem o devido retorno. No setor privado, é uma importante perda de receitas. Em ambos os casos, a evasão é uma fonte de ociosidade de professores, funcionários, equipamentos e espaço físico.
Com isso, percebe-se o quanto os estudos sobre evasão se fazem necessários no contexto brasileiro, não só no tocante à identificação de índices e causas, mas também, na mensuração das consequências que o fenômeno acarreta para o sistema universitário brasileiro.
5.Considerações Finais
O presente artigo teve por objetivo realizar uma revisão da produção de conhecimento sobre evasão relacionada ao contexto universitário brasileiro, no período 2000- 2011. A análise realizada verificou que a produção existente sobre o tema é, ainda, bastante escassa, situação que foi duplamente verificada, tanto nos principais periódicos indexados no sistema Qualis da CAPES, quanto no banco de Teses e Dissertações.
Dentre os poucos estudos encontrados sobre o tema, predominam as investigações de natureza qualitativa, o que reflete a tendência da produção de conhecimento no campo da Educação no Brasil. Poucos são os estudos quantitativos e, ainda, dentre esses, prevalecem análises estatísticas simplificadas, o que minimiza as potencialidades desse método de pesquisa, o qual oferece alto poder de detecção, ampliação e massificação de fenômenos complexos, como é o caso da evasão.
Outro aspecto a considerar reside na abrangência das pesquisas encontradas no período analisado. Mesmo que se observe qualidade e relevância nessas pesquisas, verifica-se que a maioria dos estudos realiza investigações em contextos locais, investigando a evasão em um único curso de graduação. Dessa forma, exceto pelos poucos trabalhos verificados, carecem investigações que se detenham em traçar um panorama abrangente acerca da evasão na Educação Superior brasileira.
A partir da análise realizada, possibilitou-se identificar uma diversidade de conceitos relacionados à evasão. Observou-se que, mesmo que os autores utilizem diferentes nomenclaturas, existe um entendimento comum acerca do significado da evasão no contexto do ensino superior. Quanto às prováveis causas da evasão, também foi possível verificar convergências entre os autores, quanto aos diferentes fatores associados ao abandono e permanência na universidade.
Por parte dos estudos analisados, há um consenso de que os fatores econômicos não são os únicos responsáveis pelo abandono nos cursos de graduação. De forma geral, observou-se um grande destaque para os fatores pessoais, relacionados com a escolha do curso, com as expectativas pregressas ao ingresso, com o grau de satisfação com o curso e com a instituição, além das questões associadas ao desempenho, como os principais fatores relacionados com a evasão. Assim, os estudos apontam o próprio aluno como o principal responsável pela decisão de evadir ou permanecer no ensino superior.
Por fim, considerando-se a realidade brasileira, na qual se detecta a carência de produção e as dificuldades de obtenção de um conhecimento abrangente acerca da evasão acadêmica, faz-se necessário explorar as relações existentes na literatura a partir de outras esferas do conhecimento construído sobre a Educação Superior. Dessa forma, o entendimento da evasão não pode estar dissociado dos condicionamentos sociais, políticos e socioeconômicos do contexto a ser analisado.
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